Contaminação por radiação e o auxílio-doença: como garantir esse benefício?
O auxílio-doença é um benefício previdenciário de extrema relevância dentro da proteção social brasileira. Ele assegura que trabalhadores que enfrentam problemas de saúde temporários, mas incapacitantes, tenham um suporte financeiro para manter sua subsistência e a de sua família.
Desse modo, quando falamos em contaminação por radiação, esse benefício assume importância ainda maior. Isso porque a exposição a radiação pode gerar consequências graves, imediatas e de longo prazo, afetando a saúde física, a capacidade laboral e a qualidade de vida do trabalhador. Em muitos casos, o afastamento do trabalho é inevitável, seja por recomendação médica ou por risco de agravamento da doença.
Neste artigo, vamos explorar em detalhes como funciona o auxílio-doença para casos de contaminação por radiação: quem tem direito, como é feita a perícia, quais documentos apresentar e quais estratégias aumentam as chances de concessão do benefício.
Índice
O que é o auxílio-doença?
O auxílio-doença é um benefício pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ao segurado que, por motivo de doença ou acidente, não consegue trabalhar por mais de 15 dias consecutivos.
Nesse sentido, trata-se de um benefício substitutivo de renda, ou seja, sua finalidade é garantir que o trabalhador possa se manter financeiramente enquanto se encontra incapacitado para exercer sua profissão.
Além disso, o valor do auxílio-doença é calculado a partir da média dos salários de contribuição do segurado, respeitando os limites estabelecidos pela legislação previdenciária.
Existem duas modalidades:
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Auxílio-doença previdenciário (B31): quando a incapacidade não está diretamente ligada ao trabalho.
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Auxílio-doença acidentário (B91): quando a incapacidade resulta de acidente de trabalho ou doença ocupacional.
No caso da contaminação por radiação, o enquadramento pode variar. Se a exposição ocorreu no ambiente laboral, o benefício deve ser classificado como acidentário, o que garante proteções adicionais, como a estabilidade no emprego por 12 meses após o retorno.
Quem tem direito ao auxílio-doença?
De modo geral, qualquer trabalhador segurado do INSS pode requerer o auxílio-doença. Para tanto, deve cumprir três requisitos básicos:
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Qualidade de segurado – estar contribuindo regularmente para o INSS ou dentro do chamado período de graça (intervalo em que o segurado mantém os direitos previdenciários mesmo sem contribuir).
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Carência mínima – em regra, exige-se pelo menos 12 contribuições mensais.
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Comprovação da incapacidade temporária – por meio de exames, laudos e relatórios médicos que demonstrem a impossibilidade de exercer a atividade profissional.
Entretanto, em situações de doenças graves ou acidentes de trabalho, a lei dispensa o requisito da carência. No caso de contaminação por radiação, o reconhecimento de gravidade é frequente, já que os danos podem evoluir rapidamente e comprometer funções vitais.
Como a contaminação por radiação afeta a capacidade de trabalho?
A radiação ionizante tem potencial de causar efeitos agudos e crônicos no organismo humano. Os impactos variam de acordo com a intensidade da exposição, o tempo de contato e a área afetada. Entre os principais sintomas e complicações, podemos citar:
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Efeitos imediatos: náuseas, vômitos, diarreia, tontura, febre e fadiga extrema.
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Lesões cutâneas: queimaduras, descamação, feridas de difícil cicatrização.
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Alterações sanguíneas: redução das plaquetas, glóbulos vermelhos e brancos, aumentando o risco de infecções e hemorragias.
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Comprometimento imunológico: dificuldade em combater doenças comuns.
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Efeitos tardios: infertilidade, catarata, problemas cardiovasculares e aumento significativo do risco de câncer.
Essas condições impactam de forma direta a capacidade de trabalho. Profissionais expostos à radiação geralmente precisam de afastamento imediato, seja para iniciar tratamento, seja para evitar agravamento da contaminação.
Quem pode solicitar o auxílio-doença por contaminação por radiação?
O benefício pode ser solicitado por diferentes categorias de segurados:
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Empregados com carteira assinada: técnicos de radiologia, profissionais da saúde, trabalhadores de usinas e laboratórios.
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Autônomos e contribuintes individuais: médicos radiologistas, dentistas, veterinários, entre outros.
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Segurados especiais: agricultores ou pescadores que, eventualmente, possam ter contato com fontes de radiação em atividades específicas.
Se a contaminação estiver diretamente relacionada ao ambiente de trabalho, o correto é solicitar o auxílio-doença acidentário (B91), que garante, além do benefício, a estabilidade de 12 meses após o retorno às atividades.
Quais são os requisitos para concessão?
Para obter o auxílio-doença, o segurado deve atender aos seguintes requisitos:
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Comprovação da doença e incapacidade laboral – feita por meio de relatórios médicos, exames laboratoriais, prontuários hospitalares e atestados.
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Afastamento superior a 15 dias – os primeiros 15 dias, em caso de empregado com carteira assinada, devem ser pagos pela empresa; a partir do 16º, o INSS assume.
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Carência mínima de 12 contribuições – exceto em casos de doenças graves ou acidente de trabalho, onde há dispensa.
Como comprovar a incapacidade?
A documentação médica é peça central no processo administrativo. É recomendável apresentar:
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Relatórios médicos emitidos por especialistas (oncologistas, radiologistas, hematologistas).
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Exames laboratoriais demonstrando alterações provocadas pela radiação.
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Registros de internação hospitalar e evolução clínica.
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Prescrições de medicamentos específicos para o tratamento.
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Atestados médicos descrevendo o impacto funcional no trabalho.
Um laudo detalhado, que explique não apenas a doença, mas também como ela limita as atividades laborais, aumenta significativamente as chances de deferimento do benefício.
A perícia médica do INSS
A perícia é etapa obrigatória. O perito do INSS avaliará:
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A gravidade da contaminação;
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A presença de sintomas incapacitantes;
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O risco de complicações futuras;
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A necessidade de afastamento por prazo indeterminado.
Além disso, é necessário levar todos os documentos médicos atualizados e organizados. Muitas vezes, a falta de informações claras no dia da perícia é a causa principal das negativas do benefício.
A importância de um laudo médico detalhado sobre a contaminação por radiação
A prova mais relevante é o laudo médico. Ele deve conter:
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Diagnóstico completo, com CID da doença.
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Descrição minuciosa das limitações impostas pela contaminação.
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Indicação expressa da incapacidade para exercer atividade laboral.
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Previsão do tempo de afastamento necessário.
Quanto mais técnico, objetivo e embasado em exames for o laudo, maior a probabilidade de êxito.
O que acontece se o trabalhador for demitido?
Se o trabalhador for demitido durante o afastamento, não perde o direito ao auxílio-doença. O INSS continuará pagando o benefício enquanto a incapacidade estiver comprovada.
Além disso, no caso de benefício acidentário (B91), a lei garante estabilidade de 12 meses após o retorno ao trabalho, protegendo o empregado de demissão arbitrária.
Como solicitar o benefício?
Existem duas formas de solicitar:
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Presencialmente em uma agência do INSS, mediante agendamento prévio.
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Online pelo portal ou aplicativo Meu INSS.
Documentos necessários:
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Documento de identificação oficial com foto e CPF.
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Carteira de trabalho ou guias de recolhimento (para autônomos).
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Laudo médico detalhado e exames recentes.
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Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), no caso de exposição ocupacional.
Qual é o prazo para análise?
O INSS tem até 45 dias para analisar o pedido. Durante esse período, o segurado pode acompanhar o andamento pelo sistema Meu INSS. Se houver demora excessiva, é possível ajuizar ação judicial para exigir a apreciação do pedido.
O que fazer diante da negativa do benefício?
Em caso de negativa, o segurado pode adotar três medidas:
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Apresentar recurso administrativo ao próprio INSS.
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Solicitar nova perícia médica, apresentando documentos complementares.
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Ingressar com ação judicial, oportunidade em que será realizada uma perícia independente, muitas vezes mais detalhada do que a administrativa.
Nesse sentido, existem pareceres judiciais favoráveis:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE . CAUSA MADURA. ATIVIDADE ESPECIAL. TRABALHO RURAL. RADIAÇÃO NÃO IONIZANTE . HIDROCARBONETOS. TRABALHO URBANO. RUÍDO. UMIDADE . TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO E CARÊNCIA INSUFICIENTES. PERÍODO DE RECEBIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA INTERCALADO COM CONTRIBUIÇÕES. TEMA 1125/STF. CONTRIBUIÇÕES VERTIDAS COM ALÍQUOTA REDUZIDA . IMPOSSIBILIDADE DE CÔMPUTO. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TEMA 350/STJ . FALTA DE INTERESSE DE AGIR. Após a apreciação de todas as questões apresentadas na inicial, o juízo a quo condicionou a concessão do benefício previdenciário à análise do INSS quanto ao preenchimento dos requisitos, incorrendo em violação ao princípio da congruência, previsto no art. 492, § único, do CPC. A sentença deve ser declarada nula, restando prejudicada a apreciação do apelo interposto . O processo se encontra em condições de imediato julgamento, sendo possível a apreciação do mérito da causa, com fundamento no art. 1013, § 3º, do CPC. Pretende a parte autora o reconhecimento judicial de períodos de atividade especial, com a devida conversão, bem como o cômputo de períodos em que recebeu auxílio-doença intercalados com períodos contributivos, os quais, somados aos períodos já computados administrativamente, ultrapassariam o tempo necessário à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. Incabível o reconhecimento da especialidade por exposição a radiação não ionizante, uma vez que tal agente é considerado insalubre para fins previdenciários somente quando proveniente de fontes artificiais . Em sendo proveniente de fonte natural de calor (sol), não há que se falar em especialidade do labor. Possível o enquadramento dos períodos rurais por exposição a hidrocarbonetos policíclicos aromáticos presentes na fuligem da palha da cana-de-açúcar queimada, com base nos códigos 1.2.11 do Anexo III do Decreto nº 53 .831/64 e 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 . Cabível o reconhecimento da especialidade por exposição a ruído de nível 83,16 dB (A), uma vez que acima do limite de tolerância de 80 dB (A) previsto no Decreto nº 53.831/64. Conforme previsto no código 1.1 .3 do Decreto nº 53.831/1964, para ser capaz de ser nociva à saúde, a umidade do local em que exercida a atividade deve ser excessiva e proveniente de fontes artificiais, em trabalhos em contato direto e permanente com água, como lavadores, tintureiros, operários nas salinas, entre outros, o que não ocorre na limpeza de banheiros de quartos de hotel. A conclusão do perito, está claramente em desacordo com referida previsão, de modo que não é possível o enquadramento do período em questão. Nos termos do art . 479 do CPC, o juízo não está vinculado às conclusões do laudo técnico pericial, podendo delas discordar, fundamentadamente, em razão dos demais elementos probatórios coligidos aos autos. A jurisprudência, principalmente após o julgamento do RE 583.834/PR, com repercussão geral, passou a admitir a contabilização dos períodos usufruídos de auxílio-doença, intercalados com atividades laborativas ou com períodos contributivos, inclusive para fins de carência e não só, na contabilização do tempo de contribuição. – Reafirmando a sua jurisprudência, o E . STF firmou o Tema 1125, nos seguintes termos: “É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalado com atividade laborativa”. A legislação previdenciária não confere a benesse da aposentadoria por tempo de contribuição a quem contribui, como segurado facultativo ou contribuinte individual, com alíquotas de 5% ou 11% do mínimo legal. Contribuição não validada equipara-se a ausência de contribuição, e, como tal, não há supedâneo legal para, no caso concreto, contabilizar os períodos em que a parte autora esteve em gozo de auxílio-doença, seja para fins de tempo de contribuição, seja para fins de carência. Somando-se os períodos comuns já computados administrativamente aos períodos especiais ora reconhecidos, estes últimos com a devida conversão, a autora totaliza, até a DER, 11 anos, 9 meses e 26 dias de tempo de contribuição e 137 meses de carência, não fazendo jus ao benefício pleiteado, nos termos do art . 201, § 7º, inc. II, com redação dada pela EC 20/98. No tocante ao pedido subsidiário de restabelecimento/concessão de auxílio-doença com conversão em aposentadoria por invalidez, embora não configurada a coisa julgada em relação ao período posterior à 14/6/2018, ausente o interesse de agir por inexistência de prévio requerimento administrativo, consoante o que restou definido pelo STJ no âmbito do Tema 350. Extinção do feito sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC . Diante da sucumbência mínima da autarquia previdenciária, fica a parte autora condenada ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios no importe de 10% sobre o valor da causa, observada a suspensão da exigibilidade em razão da gratuidade de justiça. Sentença anulada de ofício e, em novo julgamento, com fundamento no art. 1.013, § 3º, do CPC, pedido principal parcialmente procedente . Quanto ao pedido subsidiário, extinto o feito sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC. Apelação do INSS prejudicada.
(TRF-3 – ApCiv: 50370306620224039999, Relator.: Desembargador Federal PAULO BUENO DE AZEVEDO, Data de Julgamento: 09/08/2024, 8ª Turma, Data de Publicação: DJEN DATA: 14/08/2024)
Reavaliação e possibilidade de aposentadoria
O auxílio-doença não é definitivo. O INSS pode exigir perícias periódicas para verificar se a incapacidade persiste.
Por isso, se ficar comprovado que a contaminação por radiação gerou incapacidade total e permanente, o benefício pode ser convertido em aposentadoria por invalidez.
Conclusão
A contaminação por radiação é uma condição grave, que pode trazer efeitos imediatos e também repercussões ao longo de toda a vida do trabalhador. Por isso, o auxílio-doença é um direito essencial, garantindo segurança financeira e dignidade em um momento de fragilidade.
Desse modo, cumprir os requisitos legais, apresentar documentação médica completa e estar preparado para a perícia são etapas fundamentais para assegurar a concessão.
Portanto, estamos diante de mais do que um benefício previdenciário, trata-se de uma rede de proteção social indispensável para quem enfrenta as consequências de uma exposição radioativa.
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